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A Palavra Mágica do Yoga - Pedro Kupfer

por Pedro Kupfer

Todos conhecemos bem a palavra sânscrita namaste. Até os não praticantes de Yoga da minha família adotaram o namaste como uma saudação cotidiana, por força de nos ouvir usando esse termo tão lindo, e a gente se diverte com isso. Esta saudação se estendeu atualmente a muitos ambientes alheios ao Yoga e à espiritualidade e até entrou para os dicionários ingleses, por influência dos emigrantes indianos para o Reino Unido. De namaste deriva ainda a palavra persa namaz ou namasés, que é o nome da prece/prostração que os muçulmanos fazem cinco vezes por dia.

Namaste vem de namah, que significa “entrega”, “reverência”. O Yoga explica que toda a criação é namarupa, uma infindável miríade de formas e nomes, que são todos nomes e formas do único Ser, Brahman. Namaste aponta então para o Ser, manifestado e presente sob todos os nomes e todas as formas, animadas e inanimadas. Sendo estes nomes e formas diferentes aspectos da manifestação de Brahman, o Ser, todas as formas de vida, bem como todas as formas inanimadas, são sagradas e dignas de respeito.

É por isso que o hinduísmo reverencia todas as criaturas e formas de vida, e é por isso que o princípio da não-violência, ahimsa, é tão importante para todos nós, praticantes e não praticantes de Yoga. Nós conhecemos esse respeito pela vida através da imagem de Kamadhenu, a vaca sagrada, que simboliza a generosidade sem limites de toda mãe, e representa a sacralidade da própria existência.

Assim como no Ocidente existe um significado lindo e profundo por trás da palavra “adeus”, namaste também tem uma historinha por trás das suas sete letras. Aliás, “adeus” é a contração de uma antiga fórmula de saudação que, completa, era “entrego-te a Deus”. Noutras palavras, “a Deus encomendo tua alma já que, a partir de agora, não estarei contigo para te cuidar”. De adeus, o dicionário Houaiss diz: “Fórmula de despedida com que se pede a proteção de Deus para quem fica ou parte e que significa Deus fique contigo, Deus vá contigo”.

Similarmente, namaste ou namaskar são usadas como saudação, tanto no encontro como na despedida entre as pessoas. Literalmente, significa “a você, meu namaskar”, minha reverência, meu reconhecimento da presença do Ser em você. Esta palavra é a primeira num mantra védico para Shiva, chamado Sri Rudram, que aparece no Rig Veda, o livro mais antigo da Humanidade, que trata extensamente da vida de Yoga. A estrofe inicial deste hino é assim:

Namaste astu Bhavagan, Vishveshvaraya Mahadevaya Tryambakaya
Tripurantakaya Trikalagnikalaya Kalagnirudraya Nilakanthaya Mrityuñjayaya
Sarveshvaraya Sadashivaya Shrimanmahadevaya Namah.

A tradução do mantra é a seguinte: “Minha saudação a ti, Senhor, Mestre do Universo, Grande Senhor, dotado de três olhos, Destruidor de Tripura, Destruidor do fogo Trikala e do fogo da morte, Aquele de Garganta Azul, o Vitorioso sobre a Morte, o Senhor de Tudo, o Sempre-Auspicioso, o Glorioso Senhor de todas as Deidades”.

Shiva é, no hinduísmo, a forma divina que dissolve a criação no fim dos ciclos cósmicos. O nome significa “auspicioso”. Shiva representa assim, transformação, mudança, renovação, aceitação e gratidão. Como toda mudança é para o bem, ou acontece para o bem, Shiva aponta para o poder dessa transformação, bem como para a gratidão decorrente dela.

Isto nos mostra que, mesmo quando não compreendemos, ou temos dificuldade em aceitar as contingências boas e menos boas que a vida nos coloca, o que cabe é cultivar o contentamento e a aceitação pacífica dessas mudanças. O terceiro olho de Shiva representa a sabedoria, pela qual o adharma (erro de conduta), é eliminado e moksha é alcançado. Moksha é a libertação da roda dos condicionamentos, o samsara.

A saudação namaste é tradicionalmente acompanhada de um gesto chamado añjali mudra, com as palmas das mãos unidas frente ao coração, e uma ligeira inclinação da cabeça, em sinal de respeito. Nos templos hindus, as deidades são reverenciadas fazendo-se o gesto de namaskar, que é, para os homens, uma prostração completa de bruços e, para as mulheres, uma inclinação da cabeça até o chão, sentando sobre os calcanhares.

Desses dois gestos físicos de prostração, o masculino e o feminino nasceram, naturalmente, o surya e o chandra namaskar, a saudação ao Sol e à Lua, que são muito familiares para os praticantes de Hatha Yoga. À beira do rio Ganges, na Índia, é muito freqüente vermos pessoas fazendo namaste para as águas sagradas, com um gesto também familiar para os praticantes de Yoga, que consiste em elevar os braços até o céu e fazer uma flexão à frente.

Assim, na próxima vez que formos usar esta linda saudação, façamos isso conscientemente, lembrando que aquele que está na nossa frente não é, essencialmente, diferente de nós mesmos. Todos os nomes, todas as formas, todos os humanos, todas as criaturas vivas, são dignas do mesmo respeito, da mesma reverência.

Que possamos lembrar e celebrar esse significado nos encontros e despedidas com cada amigo, com cada companheiro de caminhada, com cada ser humano, mesmo se ao invés de namaste, dizermos “bom dia”. Namaste para você!

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